Eletrizantes!

Eles vivem na água doce. Por terem o corpo alongado e achatado nas laterais, são conhecidos como peixes-faca. Na Amazônia, também recebem o nome de sarapó. Mas o que você vai gostar mesmo de saber é que eles podem ser chamados de peixes-elétricos. Por quê? Porque esses animais são capazes de produzir eletricidade, o que, por mais incrível que possa parecer, acaba ajudando-os a encontrar alimento, se localizar e até se comunicar. Vamos conhecer, então, esses peixes para lá de eletrizantes?!


Os peixes-elétricos ocorrem desde o México até a Argentina, mas é na floresta amazônica que existe a maior variedade de espécies desses animais.

Sem nadadeiras na cauda e no dorso – as costas –, esses animais têm como características mais extraordinária o fato de gerarem eletricidade, formando, ao seu redor, um campo de força elétrica, algo que poderíamos comparar, para facilitar o entendimento, aos campos de força que, muitas vezes, envolvem os personagens de desenhos animados.

Porém, essa comparação é só para você ter uma idéia do que estamos falando. Afinal de contas, os campos de força dos peixes-elétricos não servem como uma barreira aos ataques de um vilão, mas sim, como um radar, que lhes permitem detectar objetos, obstáculos, mesmo no escuro.

Quer saber como isso é possível? Então, preste atenção: o peixe elétrico tem, espalhado pelo seu corpo, células que funcionam como um sistema de detectores ou, se você preferir, como uma antena. Essas células, chamadas eletrorreceptores, estão constantemente monitorando o campo elétrico formado ao redor do peixe.
Assim como os nossos olhos têm células especializadas para detectar a luz e os nossos ouvidos têm células especializadas em detectar sons, os peixes-elétricos possuem os eletrorreceptores, que estão constantemente “atentos” ao campo elétrico e, dessa forma, são capazes de detectar qualquer variação que ocorra nele, o que pode acontecer por conta da aproximação de um ser vivo, de um objeto ou de um obstáculo. Quem não gostaria de ter um radar desses?

Hoje, porém, já se sabe que a eletricidade produzida pelo peixe elétrico não os ajuda apenas nesse sentido. Cada uma das 150 espécies que existem também apresenta uma descarga elétrica própria e, assim, eles podem usar os sinais elétricos que emitem para se comunicarem, especialmente durante o período reprodutivo.
a capacidade de o peixe-elétrico produzir eletricidade tem fascinado os cientistas há mais de dois séculos e, hoje, já há um conhecimento razoável sobre a sua origem. Esse animal é capaz de gerar eletricidade porque possui um órgão modificado, que funciona como se fosse uma bateria. Chamado de órgão elétrico, ele, em vez de se contrair quando recebe um impulso nervoso vindo do cérebro, produz pequenas descargas elétricas por meio de cada uma de suas células.

A maioria das espécies de peixe-elétrico produz descargas elétricas fracas, usadas para orientação e comunicação. O peixe elétrico, conhecido como puraque ou poraquê, porém, gera descargas muito fortes, que podem ultrapassar 600 volts, energia suficiente para acender seis lâmpadas de 100 watts, como as que usamos em nossas casas. Essa espécie – que pode atingir mais de 2,5 metros de comprimento e é chamado pelos cientistas de Electrophorus electricus – usa esse choque para defesa e para paralisar suas presas antes de comê-las.
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Poraquê (Electrophorus electricus). Foto: Wikipédia 
 
Na Amazônia, há muitas histórias de pessoas que morreram pelo choque do puraque e, de fato, isso é possível. Quando provocado ou em caso de defesa, esse peixe elétrico é capaz de gerar alguns milhares de choques, antes que as suas “baterias descarreguem”.

Assim sendo, se uma pessoa estiver dentro d’água, em algum local fundo, ela pode morrer tanto por algum tipo de distúrbio cardíaco causado pelos choques, como por afogamento, já que as descargas do puraque podem paralisar os músculos e impedir que a pessoa nade.

Muitas outras crenças dos povos da Amazônia, porém, ainda não foram comprovadas. Há quem acredite, por exemplo, que a gordura do puraque é um ótimo remédio para doenças das articulações e reumatismos, o que faz com que muitos peixes desse tipo sejam capturados na região todos os anos. Em alguns locais, também se acredita que quem conseguir segurar um puraque com a mão, sem larga-lo durante as descargas, fica mais forte. Que jeito perigoso de querer se fortalecer, você não acha?

Na mira dos cientistas

Os peixes-elétricos são encontrados em praticamente todos os tipos de ambientes aquáticos desde pequenos lagos e igarapés – até em grandes rios, a mais de 40 metros de profundidade.

Várias pesquisas sobre esses animais têm sido feitas no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia. um desses trabalhos tem como objetivo tentar descobrir a relação evolutiva entre as diferentes espécies que existem. Ou seja, saber mais sobre a relação de parentesco entre as diferentes espécies, como esses animais surgiram, como ocuparam o espaço onde se encontram atualmente, quando uma espécie se parece com a outra…

Também há séculos que buscam compreender como esses peixes usam a eletricidade que produzem nas diversas atividades do dia-a-dia. eles analisam, por exemplo, os sinais elétricos gerados entre machos e fêmeas durante o período reprodutivo. O intuito é entender melhor como eles se comunicam por meio desses sinais elétricos e como eles usam essa, digamos, linguagem elétrica para se reconhecerem como espécie.

Outra pesquisa vem tentando descobrir como usar o peixe-elétrico para monitorar a qualidade da água. Sabe-se que alterações na saúde e o funcionamento normal do organismos desses animais – e até na temperatura da água – causam mudanças na eletricidade produzida por eles. Estuda-se, no momento, como poluentes presentes na água podem provocar essas alterações.

Os primeiros trabalhos já mostraram que, em poucos minutos, pode-se detectar poluentes resultantes da exploração de petróleo. a partir daí, a idéia é desenvolver um sistema para saber se os rios e igarapés da Amazônia estão sendo contaminados por poluentes gerados pelo ser humano. Esse sistema teria os peixes-elétricos como peças fundamentais e oferecia informações a cada minuto.

Tudo isso é para você ver que o peixe-elétrico, além de ter características muito curiosas, ainda pode ser um aliado nos cuidados com o meio ambiente!

GOMES, José Antônio Alves. Eletrizantes! Ciência Hoje das Crianças, ano 20, nº 180, jun.  2007.
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